No coração de São Gonçalo, uma das cidades mais populosas do estado do Rio de Janeiro, ergue-se uma barricada diferente. A menos de 500 metros de uma delegacia, em meio ao cotidiano agitado da cidade, a resistência se manifesta em forma de livros. A iniciativa é liderada pelo produtor cultural e empresário Adelino Góes, que transforma a ação cultural em um ato político, promovendo acesso democrático à leitura para a população.
A chamada “Barricada de Livros” integra a Estante Comunitária Carolina Maria de Jesus, uma iniciativa de doação e empréstimo de livros. O projeto nasceu em resposta à grave carência de bibliotecas públicas e outros equipamentos culturais na região. Mais do que oferecer livros, a barricada representa um convite à transformação: o sonho de Adelino é ver jovens negros, pobres e periféricos se armarem de conhecimento, abrindo caminho para um futuro digno e livre de preconceitos.
“Queremos que esses jovens protagonizem histórias de superação e conquistas, e não que sejam reduzidos a estatísticas ou retratados de forma sensacionalista nas manchetes de jornais”, afirma Adelino.
Ele acredita que o acesso à leitura e à cultura é um direito essencial, e não um privilégio, especialmente em uma cidade marcada por desafios sociais e econômicos.
A barricada, que começou pequena, já conta com livros de diversos gêneros, desde literatura clássica até obras contemporâneas, passando por títulos de filosofia, história, ciência e poesia. A Estante Comunitária, que homenageia Carolina Maria de Jesus – uma das primeiras escritoras negras do Brasil e símbolo de resistência cultural, é também um espaço de troca de ideias e fortalecimento comunitário.
A iniciativa tem inspirado outras ações na cidade e reforçado a importância de investir na educação e na cultura como ferramentas de transformação social. Para Adelino, cada livro compartilhado é uma semente plantada, capaz de florescer em forma de cidadania, consciência e esperança.
“A Barricada de Livros é, acima de tudo, uma resistência pacífica, mas poderosa, que desafia a desigualdade e promove uma nova narrativa para São Gonçalo. Mais do que uma simples ação cultural, é um manifesto em defesa do futuro.” reforça Adelino.
Adelino e os livros
A iniciativa da Estante Comunitária Carolina Maria de Jesus, se não é um sonho antigo, remonta a pelo menos três décadas. Logo após chegada dele a São Gonçalo, quando percebeu a inexistência de livrarias ou sebos na região.
“No entanto, esse sonho só pôde se concretizar durante a pandemia, quando comecei a compartilhar a ideia com amigos e clientes. Para minha surpresa, muitos deles prontamente se dispuseram a ajudar, tornando possível a realização desse projeto tão especial.” declara o empresário.
Adelino Góes, assim como cerca de 30% da população de São Gonçalo (RJ), é nordestino ou descendente. Natural do Ceará, ele chegou ao Rio de Janeiro em 1978 e se estabeleceu em São Gonçalo em 1989, onde iniciou sua atuação no ramo de vidraçaria e decorações, área na qual permanece até hoje.